quinta-feira, 15 de julho de 2010

Não vá de trem (a menos que queira evitar engarrafamento ou comprar uma balinha)

Já que semana passada eu escrevi porque eu gosto de andar de trem, então é justo agora apontar os problemas do sistema ferroviário carioca/fluminense.

Andar de trem é um privilégio para poucos. Se enquanto a frota de ônibus apresenta uma diminuta proporção (tem aumentado, é verdade) de veículos adaptados a pessoas com deficiências de locomoção, idosos, gestantes e obesos, para esses (sobretudo cadeirantes e deficientes visuais) é simplesmente impossível chegarem sozinhos ao interior de uma composição. Porque os acessos às estações são sempre via escadarias. Mesmo nas poucas estações com escadas rolantes (lembro de duas, Méier e Engenho de Dentro, nem sempre elas estão em funcionamento), o cadeirante enfrenta dificuldades para acessar as plataformas. Uma vez lá, subir no trem se torna uma tarefa arriscada, inclusive para os idosos, que passaram pela etapa das escadas com um pouco menos de dificuldade: na maioria das estações, as plataformas são muito afastadas dos trilhos, ou estão em alturas muito diferentes em relação aos trens. Na estação da Mangueira, há praticamente uma pessoa de espaço entre o trem e a plataforma, e em São Cristóvão, são cerca de 40cm de altura por 40cm de distância que a pessoa tem que superar para embarcar e desembarcar.

Embora eu tenha feito graça com os ambulantes no último post, do ponto de vista legal eles também são um problema. Há ambulantes cadastrados e uniformizados que vendem produtos fornecidos por empresas autorizadas pela concessionária, e há os informais, que vendem tudo muito mais barato (não precisam incluir nos preços o custo da licença de trabalho) e passam o dia de trem em trem fugindo da fiscalização da Supervia. Embora a maioria dos informais esteja comercializando produtos obtidos legalmente de atacadistas, não se pode por a mão no fogo por todos. Alguns - como dois irmãos que vendiam danoninho a preço de bala um dia desses - parecem ter obtido a mercadoria por furto ou extravio. Sem falar nos produtos piratas que ferem direitos autorais, não tem garantia, e geralmente, não tem qualidade também. Eu não serei hipócrita de dizer que sou contra os ambulantes informais e que eles precisam ser tirados de circulação, porque não só eles estão ganhando seu dinheiro com trabalho, como também oferecem tudo a preço de atacado, o que pra nós, que somos pobres, é uma grande vantagem.

Quanto aos trens propriamente ditos, há várias gerações de modelos em circulação. Tem os "caveirões" que se mantêm íntegros por um milagre qualquer, e que circulam preferencialmente nas linhas que vão para a Baixada Fluminense, mas nas outras também. Nesses, só de pisar dentro parece que você vai pegar uma doença, de tão quebrados e sujos que são. Também há trens com ar condicionado, os mais antigos diferindo pouco em conforto dos caveirões, mas os mais novos fazendo frente ao metrô que percorre a Zona Sul da cidade. Esses trens circulam nas linhas que vão para a Zona Oeste. No entanto, em 2008, o governador atual foi à China e realizou a compra de novos trens, que deveriam ter sido colocados em circulação neste ano em substituição aos mais antigos, mas dos quais ainda não vi nem a cor. Quem sabe quando ele estiver em plena campanha eleitoral?

Estrutura das plataformas, qualidade dos trens e segurança são relativamente fáceis de se melhorar. Mas há um problema crônico no sistema de trens urbanos do Rio, que é a quase impossibilidade de expansão das linhas. As linhas de trem circulam, do começo ao fim, sufocadas por avenidas e construções em ambas as margens da via. Por onde passam 3 linhas, não poderá, um dia, passar uma quarta, porque não tem pra onde crescer, a menos que se procedam complicados processos de expropriação e reestruturação urbana dos bairros. Quando as estradas de ferro foram construídas, elas saíam do Centro da cidade, e ligavam as vilas que compunham os antigos bairros, e entre elas passava por áreas largamente desabitadas. A estação de Campo Grande data do século XIX, nem consigo imaginar a selva que devia ser no caminho até lá (entre a estação Augusto Vasconcelos, a que vem imediatamente antes de Campo Grande, e a anterior, Santíssimo, é o único trecho do ramal Campo Grande onde, em um dos lados da estrada, não se vê um muro gigante encostado em milhões de casas). O fato é que a cidade cresceu no entorno das linhas, e elas não tem mais espaço. Enquanto isso, a população cresceu, os trens lotaram, e as linhas estão chegando ao seu limite máximo. São frequentes os atrasos e esperas porque mais à frente tem outro trem já ocupando a estação. Na Zona Oeste existem dois ramais com três linhas (Bangu, Campo Grande, e Santa Cruz) que, na prática, passam pelos mesmos lugares e ocupam os mesmos espaços, e a demanda é enorme.

Apesar de tudo, ainda assim o Rio está melhor servido de trens do que do metrô, que tem só uma linha e meia (as duas linhas compartilham dos mesmos trilhos na maior parte do percurso... o que não faz o menor sentido). É mais ou menos o oposto de São Paulo, cujas ferrovias tem sido gradualmente deixadas de lado, enquanto o sistema metroviário abastece uma imensidão de regiões da capital.

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